Aposentados na linha de frente: protestos contra Milei misturam crise social e paixão clubista na Argentina

BUENOS AIRES — A Argentina vive dias de tensão após manifestações contra o governo de Javier Milei se transformarem em confrontos entre aposentados, forças de segurança e grupos organizados. Os protestos, inicialmente pacíficos, ganharam destaque internacional nesta quarta-feira (XX) com cenas de violência contra idosos e acusações de infiltração política. A crise expõe o descontentamento popular com os cortes nas pensões, a escalada inflacionária e o papel inesperado de torcidas de futebol, como as de River Plate e Boca Juniors, nas mobilizações.

A Centelha da revolta
O estopim foi o anúncio, em maio, da suspensão do reajuste automático das aposentadorias, substituído por aumentos discricionários definidos pelo Executivo. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística e Censos (INDEC), 30% dos aposentados argentinos já vivem abaixo da linha da pobreza, com renda média de AR$ 180.000 (cerca de R$ 1.080) — valor corroído por uma inflação que acumula 289% em 12 meses. A medida, parte do pacote de ajuste fiscal de Milei para reduzir o déficit público, gerou revolta em um país onde os idosos representam 15% da população.

Torcidas organizadas e a politização do Caos
Nas últimas semanas, imagens de torcedores do River Plate e do Boca Juniors marchando ao lado de aposentados viralizaram nas redes. Embora as duas maiores torcidas do país tenham histórico de participação em protestos sociais, analistas apontam motivações distintas: enquanto alguns setores apoiam a causa dos pensionistas, outros são acusados de receber recursos para inflamar os atos. “Há uma instrumentalização clara. Grupos ligados a partidos opositores e até sindicatos estão financiando a desestabilização”, afirmou o ministro da Economia, Luis Caputo, em coletiva.

A acusação, porém, é rebatida por organizações de direitos humanos. “A violência partiu da repressão policial. Idosos foram agredidos com cassetetes e gás lacrimogêneo enquanto reivindicavam o básico: dignidade”, denunciou Estela de Carlotto, líder das Avós da Praça de Maio, em entrevista ao Página/12.

Cenário de guerra e polarização
Na terça-feira (XX), um protesto em frente ao Congresso Nacional terminou com 20 feridos e 15 detidos. Vídeos mostram homens encapuzados destruindo mobiliário urbano e atirando pedras contra a polícia, enquanto aposentados tentavam se proteger. O governo responsabilizou a ex-presidente Cristina Kirchner e o peronismo pela “guerra suja”, alegando uso de “métodos mafiosos” para minar as reformas. Já a oposição acusa Milei de “criminalizar a pobreza” e governar para as elites.

O que esperar?
Enquanto o presidente mantém o discurso de “não ceder ao populismo”, a pressão internacional cresce. A Anistia Internacional emitiu um comunicado exigindo investigação sobre abusos policiais, e o FMI, tradicional aliado de Milei, sinalizou preocupação com o risco de colapso social. Nas ruas, aposentados prometem intensificar os protestos, e as torcidas organizadas ameaçam paralisar o futebol argentino caso a repressão continue. Em um país onde política e paixão clubista se entrelaçam, a crise parece longe do placar final.

Fontes consultadas: BBC Brasil, G1, Infobae e declarações oficiais do governo argentino.

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