Uma divergência de números transformou o ato político em apoio a Jair Bolsonaro, realizado no domingo (26) em Copacabana, em um novo capítulo de controvérsias. Enquanto a estimativa oficial divulgada pela Polícia Militar (PM) apontou a presença de “aproximadamente 400 mil pessoas”, um estudo do Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic) da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) — referência em análise de aglomerações — calculou que o público máximo não ultrapassou 18,3 mil indivíduos no momento de maior concentração. A ordem para divulgação do número partiu do Palácio Guanabara, sede do governo estadual, mas o governador Cláudio Castro (PL) nega envolvimento.
Contradição nos números: tradição Qqebrada e falta de metodologia
A PM do Rio rompeu uma prática de anos ao divulgar estimativas de um evento político. Historicamente, a corporação abstém-se de quantificar manifestações partidárias, limitando-se a informar questões operacionais. Desta vez, porém, a assessoria do governo estadual encaminhou à imprensa o número de “400 mil presentes”, sem detalhar a metodologia utilizada. Especialistas criticam a falta de transparência:
“Não há registro de uso de tecnologias como drones com contagem por IA ou sensores térmicos, métodos comuns em grandes eventos. A PM não explicou se usou amostragem de área ou outros critérios“, afirmou um analista de segurança pública que preferiu não se identificar.
Já o Labic/UFES, que monitorou o ato via imagens de satélite e gravações em tempo real, aplicou um modelo matemático baseado na densidade de pessoas por metro quadrado. O resultado aponta que, no pico do evento, às 15h, 18,3 mil pessoas ocupavam a faixa de areia e parte da Avenida Atlântica.
Governador negou, mas documentos ligam divulgação ao Palácio
Apesar da negação do governador Cláudio Castro, documentos internos mostram que a ordem para a divulgação partiu da Casa Civil, vinculada ao Palácio Guanabara. Em nota, Castro afirmou que “não há qualquer intervenção política nas atividades da PM“, atribuindo a responsabilidade à assessoria de comunicação da corporação.
Repercussão política e comparações
A disparidade entre os números reacendeu debates sobre a manipulação de dados para fins políticos. Em 2023, o mesmo Labic/UFES estimou em 124 mil o público do show de Madonna em Copacabana, número próximo ao divulgado pela prefeitura (1,6 milhão). Especialistas ressaltam que eventos culturais costumam atrair mais pessoas, o que torna a estimativa de 400 mil para o ato político ainda mais questionável.
Bolsonaro, que discursou no evento, usou o número da PM em suas redes sociais: “O Rio de Janeiro mostrou sua força! 400 mil patriotas na praia!“. Críticos apontam a estratégia como uma tentativa de inflar apoio antes das eleições municipais.
Transparência em xeque
Para o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a falta de critérios claros na divulgação de dados de manifestações afeta a credibilidade das instituições: “Quando números são usados como instrumento político, perde-se a confiança da população“, destacou em comunicado.
Enquanto isso, o Ministério Público do Rio avalia pedir explicações formais à PM sobre a metodologia utilizada. A polêmica deve alimentar discussões sobre a necessidade de regras padronizadas para contagem de público em eventos de natureza política.
#FatoOuFake: A discrepância entre números oficiais e independentes coloca em pauta a urgência de transparência na era da desinformação.