Em março de 2020, bilhões de pessoas olhavam pelas janelas para um mundo que não reconheciam mais. Enquanto nações como Itália, Espanha e Brasil adotavam lockdowns rigorosos, alguns países optaram por um caminho polêmico: rejeitar o confinamento. Suécia, Belarus, Tanzânia e Nicarágua tornaram-se laboratórios de uma estratégia que priorizou a “liberdade” ou a negação da gravidade do vírus. Dois anos depois, o que revelam os dados sobre saúde, economia e sociedade nesses locais?
Suécia: Herd Immunity e Lições Aprendidas
A Suécia ficou famosa por sua abordagem única: sem lockdown, com bares, escolas e comércio abertos. A estratégia, inicialmente baseada na imunidade de rebanho, resultou em uma taxa de mortalidade per capita oito vezes maior que a da Noruega e cinco vezes superior à da Dinamarca em 2020, segundo o Our World in Data. Até abril de 2021, o país registrava 1.432 mortes por milhão, contra 239 na Noruega. Apesar do custo humano, o PIB sueco recuou apenas 2,8% em 2020, menos que a média europeia (6,5%), conforme o Banco Mundial. Porém, em 2022, um estudo do The Lancet destacou que o país teve excesso de mortes prolongado, questionando o equilíbrio entre economia e saúde.
Belarus: A Política do Negacionismo
Sob o comando de Alexander Lukashenko, Belarus minimizou a pandemia, sugerindo vodka e saunas como “remédios”. O governo não só evitou lockdowns como manteve eventos públicos, incluindo partidas de futebol. Dados oficiais, porém, são escassos: em 2020, foram reportadas apenas 508 mortes por COVID-19, número contestado por organizações locais, que estimam mais de 4.000 óbitos até meados de 2021. A falta de transparência e a pressão sobre médicos que alertavam para o colapso hospitalar marcaram o cenário, segundo a ONG Viasna.
Tanzânia: Da Negação à Mudança Radical
O presidente John Magufuli declarou a Tanzânia “livre da COVID-19” em 2020, sem lockdowns e com críticas às vacinas. O país parou de publicar dados em abril daquele ano, mas um estudo da Nature estimou que 50% da população da capital, Dar es Salaam, havia sido infectada até 2021. Após a morte de Magufuli (oficialmente por “problemas cardíacos”, mas com suspeitas de COVID), seu sucessor, Samia Suluhu, reverteu a política, aderindo à vacinação e reconhecendo a pandemia — um raro caso de guinada pós-catástrofe.
Nicarágua: Festas e “COVID Zero”
Enquanto o mundo fechava, a Nicarágua promovia marchas turísticas e festivais. O governo Ortega afirmou ter apenas 200 mortes em 2020, mas a Comissão Interamericana de Direitos Humanos relatou mais de 4.000 óbitos não reconhecidos. Profissionais de saúde denunciaram a falta de testes e a pressão para não registrar mortes por COVID, criando um cenário de subnotificação extrema.
O Dilema Econômico vs. Saúde
Embora países sem lockdown tenham tido quedas menores no PIB, o custo humano foi alto. A OMS alertou em 2021 que “ignorar medidas de isolamento sem estrutura sanitária é um risco mortal”. Já economistas como Anders Tegnell, arquiteto da estratégia sueca, defendem que “lockdowns prolongados geram crises sociais e psicológicas”. O debate segue, mas os números sugerem que, sem lockdown, o preço foi pago em vidas — muitas vezes, das populações mais vulneráveis.
Legado e Lições
A pandemia revelou que não há respostas simples. Enquanto nações sem lockdown enfrentaram tragédias evitáveis, outras com restrições rígidas lidaram com recessão e descontentamento. O equilíbrio, segundo a OMS, está em medidas temporárias aliadas a investimentos em saúde — algo que, para muitos países, chegou tarde demais.