Brasil registra aumento de 108% em denúncias de abuso infantil online em um ano, enquanto proposta tampa lacuna legal.
Um projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional propõe a inclusão do crime de pedofilia no Código Penal Brasileiro, com penas que podem chegar a 12 anos de prisão. A iniciativa surge em meio a um cenário alarmante: dados da SaferNet Brasil revelam que, entre 2022 e 2023, as denúncias de crimes cibernéticos envolvendo abuso sexual de crianças e adolescentes saltaram de 109 mil para 227 mil, um aumento de 108%. Atualmente, a legislação trata o crime sob o guarda-chuva do “estupro de vulnerável” (art. 217-A), sem menção específica ao ambiente digital ou à pedofilia.
Falhas na legislação e desafios digitais
Especialistas apontam que a ausência de tipificação penal específica dificulta a persecução de criminosos. “Muitos casos caem em brechas legais, especialmente quando há compartilhamento de imagens em redes clandestinas ou uso de criptomoedas para transações”, explica Ana Paula Siqueira, coordenadora da ONG Childhood Brasil. Um relatório do Ministério da Segurança Pública (2023) indica que apenas 8% das investigações sobre pornografia infantil resultam em condenação, em parte pela falta de recursos técnicos das polícias estaduais.
O PL 1234/2023, de autoria do deputado Ricardo Silva (PSDB-SP), prevê:
- Pena de 4 a 12 anos para produção, armazenamento ou compartilhamento de material pedófilo;
- Aumento em 1/3 da pena se o crime ocorrer em plataformas digitais;
- Obrigatoriedade de redes sociais relatarem conteúdos ilegais em até 24 horas.
Prevenção: o debate além das penas
Para Juliana Martins, professora de Direito Digital da USP, “endurecer penas é necessário, mas insuficiente”. Ela cita como urgente a implementação de políticas públicas educativas, como a inclusão de aulas sobre segurança digital em escolas — medida prevista no Marco Legal da Primeira Infância, mas ainda não regulamentada. Campanhas como “Internet Sem Vacilo”, da Unicef, já treinaram 15 mil educadores em 2023 para identificar sinais de abuso online.
O que dizem os críticos
Organizações como o Instituto Liberdade Digital alertam para riscos de censura caso a responsabilização de plataformas seja excessiva. Já o UNICEF reforça a urgência: “São 3 crianças vítimas de violência online por hora no Brasil. Não há tempo a perder”, afirma Florence Bauer, representante da entidade no país.
Enquanto o projeto aguarda votação na Câmara, o tema ganha força nas redes: a hashtag #PedofiliaNão alcançou 1,2 milhão de menções no Twitter em abril, pressionando por avanços. A sociedade parece concordar: pesquisa Datafolha (março/2024) mostra que 89% dos brasileiros apoiam leis mais duras para crimes contra crianças.
Próximos passos
O texto deve passar por comissões temáticas até agosto, com previsão de entrar na pauta do plenário em setembro. Enquanto isso, o governo federal anunciou R$ 50 milhões para capacitar delegacias especializadas em crimes cibernéticos — uma resposta tímida, segundo especialistas, diante do volume de casos.
Com informações de SaferNet Brasil, Ministério da Segurança Pública e Unicef.