A luta contra o racismo no ambiente corporativo ainda enfrenta barreiras significativas, apesar do crescente discurso em favor da diversidade. Para Cecília Barçante, especialista em gestão de pessoas e head de Pessoas e Cultura da Refuturiza, o combate ao racismo no ambiente de trabalho demanda mais do que intenções e declarações simbólicas: exige ações práticas e contínuas, implementadas com seriedade e comprometimento.
“É fundamental que as empresas assumam posturas antirracistas, e isso não se limita a campanhas de conscientização esporádicas”, pontua Barçante, destacando que a questão racial precisa estar no centro das políticas corporativas de diversidade e inclusão. Segundo ela, não basta promover palestras ou ações isoladas no calendário, como no mês da Consciência Negra. “Precisamos de mudanças estruturais que garantam oportunidades iguais para todos, desde o recrutamento até a promoção de lideranças negras.”
Realidade corporativa ainda distante do ideal
Dados recentes mostram que a desigualdade racial ainda é um desafio profundo no mercado de trabalho brasileiro. De acordo com o IBGE, pessoas negras representam cerca de 56% da população brasileira, mas ocupam menos de 30% dos cargos de liderança nas empresas. A disparidade salarial também é gritante: homens brancos chegam a ganhar, em média, o dobro do que mulheres negras na mesma função.
Para Cecília, esses números refletem uma cultura organizacional que ainda não se desvencilhou do racismo estrutural. Ela reforça que iniciativas antirracistas devem incluir treinamentos obrigatórios para lideranças, revisão de processos seletivos para evitar vieses inconscientes e programas de mentoria voltados para o desenvolvimento de talentos negros.
“Se não houver uma transformação genuína na forma como as empresas enxergam a questão racial, continuaremos perpetuando essas desigualdades. E as empresas que não se adaptarem a essa nova realidade correm o risco de perder relevância perante uma sociedade cada vez mais exigente quanto à ética corporativa”, alerta.
Pressão social e impacto na reputação das empresas
O debate sobre o racismo no ambiente de trabalho ganhou força nos últimos anos, impulsionado por movimentos globais como o Black Lives Matter e por episódios de discriminação amplamente denunciados nas redes sociais. Essa exposição tem pressionado empresas a adotarem políticas mais transparentes e inclusivas. No entanto, a distância entre discurso e prática ainda é grande.
Muitas organizações promovem iniciativas que Cecília classifica como “diversidade de fachada”, em que ações pontuais são realizadas sem compromisso real com a equidade racial. “Colocar uma pessoa negra em uma posição de destaque para fins de marketing, mas sem investir no crescimento dessa liderança, é apenas reforçar o problema”, afirma.
Além do impacto moral, a falta de ações antirracistas pode trazer prejuízos financeiros e reputacionais. Pesquisas mostram que consumidores estão mais atentos ao posicionamento das marcas em relação à diversidade. Empresas que falham em demonstrar compromisso verdadeiro podem ser alvo de boicotes e críticas, além de perder talentos que priorizam ambientes inclusivos.
Caminho para a transformação
Para avançar, Barçante defende que as empresas precisam abraçar a diversidade não apenas como um valor, mas como uma estratégia de negócio. “Ambientes mais diversos e inclusivos são comprovadamente mais inovadores e produtivos. A mudança não é só ética, mas também inteligente do ponto de vista econômico”, destaca.
Ela sugere que as lideranças empresariais se envolvam diretamente no debate e assumam a responsabilidade de liderar pelo exemplo. “Sem a participação ativa da alta gestão, qualquer política corre o risco de ser superficial.”
Por fim, Cecília deixa um recado contundente: “O compromisso antirracista deve ser uma prática diária, porque não há espaço para neutralidade quando o tema é racismo. Ou as empresas se posicionam a favor da equidade, ou estão contribuindo para perpetuar o problema.”
O chamado da especialista ressoa como um lembrete urgente para o mundo corporativo: combater o racismo não é apenas uma questão de justiça social, mas uma demanda essencial para construir um mercado de trabalho verdadeiramente inclusivo e justo.