Uma denúncia de espionagem envolvendo a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e autoridades paraguaias reacendeu uma crise diplomática entre os dois países, com reflexos nas negociações sobre a usina hidrelétrica de Itaipu. Fontes revelaram que a operação teria sido motivada, em parte, por suspeitas de interferência dos Estados Unidos em uma campanha contra o acordo binacional .
Suspeita de Interferência dos EUA e o Papel da ONG Demos
Segundo um oficial da Abin ouvido anonimamente, a agência monitorou atividades de uma organização não governamental (ONG) paraguaia, o Centro para a Democracia, a Criatividade e a Inclusão Social (Demos), que liderava uma campanha para revisar o acordo de Itaipu. A ONG alegava que o Paraguai deixou de receber US$ 75,4 bilhões devido aos termos do tratado, defendendo a venda do excedente energético a outros países além do Brasil .
A Abin desconfiava que a CIA poderia estar por trás da campanha, já que a Demos realizou eventos em espaços administrados por norte-americanos, como o Teatro de las Américas em Assunção, gerido por um comitê paritário de paraguaios e estadunidenses. A preocupação era que a revisão do acordo elevasse os custos da energia no Brasil, prejudicando a competitividade industrial .
O Ataque Hacker e a Suspensão das Negociações
Paralelamente, um funcionário da Abin relatou à Polícia Federal (PF) que a agência realizou um ataque hacker a sistemas do governo paraguaio entre 2022 e 2023, visando obter dados sigilosos sobre as tarifas de energia em negociação no Anexo C do Tratado de Itaipu. Ferramentas como Cobalt Strike e técnicas de engenharia social foram usadas para acessar informações de autoridades, incluindo o presidente do Paraguai e membros do Congresso .
O governo paraguaio reagiu suspendendo as negociações do Anexo C — que define as bases financeiras e tarifárias da usina — até que o Brasil ofereça “respostas satisfatórias” . O embaixador brasileiro em Assunção, José Antônio Marcondes, foi convocado para prestar esclarecimentos, e o Ministério Público do Paraguai abriu investigação criminal por crimes informáticos .
A Resposta do Brasil e a Guerra de Narrativas
O governo brasileiro negou envolvimento na operação, afirmando que ela foi autorizada durante o governo Bolsonaro e interrompida em março de 2023, sob a gestão Lula. Em nota, o Itamaraty classificou o episódio como “caso menor” e reforçou o compromisso com o diálogo transparente .
Especialistas, como Renato Ribeiro de Almeida (USP), minimizaram o impacto, argumentando que a espionagem para obter vantagens em negociações estratégicas é comum entre países. “É uma guerra de narrativas. O Paraguai busca pressionar o Brasil para ganhar concessões”, avaliou .
Itaipu: Um Acordo Sob Tensão
A usina de Itaipu, administrada conjuntamente desde 1984, é vital para ambos os países: o Brasil consome 90% da energia produzida, enquanto o Paraguai busca renegociar o excedente para vendê-lo livremente. O Anexo C, em revisão desde 2023, é central para definir tarifas e divisão de receitas .
A crise atual ameaça adiar ainda mais um acordo crucial para a estabilidade energética regional. Enquanto o Paraguai exige transparência, o Brasil insiste que a operação foi descontinuada, mas a desconfiança persiste .
Conclusão: Um Jogo Geopolítico Complexo
O caso expõe as tensões entre a defesa de interesses nacionais e os limites da espionagem internacional. Enquanto o Paraguai busca justiça e reparação, o Brasil tenta equilibrar sua imagem diplomática com a proteção de setores estratégicos. A suspeita de envolvimento dos EUA adiciona outra camada a um conflito que pode redefinir as relações no Mercosul .
Leia mais: Para detalhes sobre as ferramentas de hackers usadas e o histórico do Anexo C, acesse as fontes originais .