Em discurso inflamado, presidente argentino critica acordo regional e reforça posição contrária ao bloco, citando “assimetrias históricas”. Especialistas alertam para riscos econômicos e políticos.
O presidente argentino, Javier Milei, disparou novas críticas ao Mercosul durante entrevista a uma rádio local nesta terça-feira (25), afirmando que o bloco econômico “só enriqueceu os grandes industriais brasileiros” e prometeu acelerar a revisão da participação do país no grupo. “O Mercosul é um projeto que, na prática, funcionou como um esquema de protecionismo industrial para o Brasil, em detrimento da Argentina”, declarou.
A declaração reforça ameaças anteriores do líder libertário, que, desde sua posse em dezembro de 2023, defende uma guinada rumo à abertura comercial unilateral e redução de acordos multilaterais. Dados do Ministério da Economia da Argentina apontam que, em 2023, o Brasil registrou superávit comercial de US$ 3,4 bilhões com o país vizinho, exportando US$ 15,2 bilhões em produtos industrializados (como automóveis e máquinas) e importando US$ 11,8 bilhões (majoritariamente commodities).
Contexto histórico e reações
Criado em 1991, o Mercosul tem como pilares a livre circulação de bens e a integração política entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Analistas, porém, reconhecem que as assimetrias entre as economias geram atritos. “O Brasil, por ter um parque industrial mais consolidado, historicamente aproveitou melhor as regras do bloco”, explica Carla Reis, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV).
O governo brasileiro respondeu às críticas de Milei por meio de nota, destacando que o Mercosul “é fundamental para o desenvolvimento equilibrado da região” e que “a Argentina se beneficia de acesso privilegiado ao maior mercado da América Latina”. Em 2023, 15% das exportações argentinas foram destinadas ao Brasil, incluindo setores como biodiesel e trigo.
Riscos de uma saída
Se a Argentina concretizar a saída, perderia preferências tarifárias em um mercado de 213 milhões de consumidores brasileiros. Além disso, ficaria de fora das negociações do acordo entre Mercosul e União Europeia, em discussão há 25 anos e que prevê a criação de uma zona de livre-comércio. Para Pablo Stefanoni, analista político do Council on Foreign Relations, “a retórica de Milei reflete sua agenda antiglobalista, mas a ruptura com o bloco isolaria a Argentina em um momento de fragilidade econômica”.
O que vem pela frente?
Apesar do tom confrontativo, analistas acreditam que uma saída imediata é improvável, já que exigiria aprovação do Congresso argentino — onde Milei não tem maioria. Enquanto isso, o presidente busca alternativas bilaterais, como ampliar acordos com Estados Unidos e China, países que já respondem por 40% das exportações argentinas.
A tensão reacende o debate sobre o futuro do Mercosul: será o fim de uma era ou um novo capítulo na integração regional? A resposta pode definir não só as relações Brasil-Argentina, mas o destino econômico de toda a América do Sul.
Com informações do Ministério da Economia da Argentina, BBC Brasil e Agência Reuters.